quarta-feira, 2 de julho de 2008

A questão económica

Queria retomar a reflexão iniciada nuns posts mais abaixo - que foram literalmente afundados por uma enorme torre de Pisa :) - sobre a questão económica das desigualdades sociais (e da pobreza). Neste livro acabadinho de sair, coordenado por Alfredo Bruto da Costa, o autor salienta no capítulo final que o problema da pobreza não se resolve apenas com medidas redistributivas. «O problema reside, além do mais, na repartição primária do rendimento, da propriedade e do poder. Quando se realça o papel da repartição primária do rendimento, quer-se dizer que, antes de ser problema de políticas sociais, a pobreza é um problema de política económica» p. 197. Esta citação é suficientemente peremptória para lhe darmos alguma credibilidade, sobretudo, porque culmina um elaborado percurso analítico que utiliza, ao longo do estudo, diferentes dados estatísticos muito consistentes e bem artilhados.
Na curta vida deste blogue, tenho chamado a atenção para este aspecto: existem factores estruturais da nossa vida económico que se não forem alterados nos próximos anos, comprometerão grande parte dos resultados de certas políticas sociais e laborais que têm sido traçadas. A questão económica passa essencialmente por um modelo assente em pequenas e médias empresas geridas por empresários pouco qualificados e, em muitos casos, sem qualquer capacidade económica de investimento, que fazem depender a perpetuação da sua actividade da contratação de mão-de-obra barata e pouco qualificada. De entre os inúmeros indicadores referidos no estudo em causa, talvez o que me tenha surpreendido mais foi o que identificou cerca de 23% de vulnerabilidade à pobreza no grupo dos directores e dirigentes de pequenas e médias empresas. Outro dado: dentro desta categoria quase 70% não tem mais do que o 2º ciclo de escolaridade. Estes valores, representam, quanto a mim, um dos indicadores de alerta mais perenes da economia portuguesa, como tenho frisado em vários posts.
Segundo o estudo o grande problema da pobreza em Portugal tem a ver com os baixos salários, e não tanto com a questão da precariedade contratual. De facto, na maior parte das situações estas duas dimensões nem estão associadas: 71% dos representantes dos agregados pobres (entre 1995 e 2000) eram trabalhadores por conta de outrem e tinham (sublinhe-se) contrato permanente. Este dado é extraordinariamente revelador sobre o estado da economia portuguesa: o acesso ao trabalho (independentemente de ser precário ou não) não só não resolve a questão da pobreza como está intimamente associado a esta.
Como referi noutro post, os dados assim o indicam, existe uma forte reprodução entre a situação precária (económica, social, de qualificações) das pequenas e médias empresas - e respectivos dirigentes - e a dos trabalhadores que auferem baixíssimos salários. Perante este cenário, parece-me, como bem referem os autores, que a incidência nas políticas sociais não só é claramente insuficiente, como pode contribuir, em parte, para a perpetuação do próprio sistema. Urge então pensar-se em políticas económicas em paralelo com as políticas redistributivas. Políticas que, como é salientado no final do livro, intervenham ao nível da propriedade e da repartição do poder.

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