«Sabemos que há uma correlação positiva entre a redução das desigualdades e a força do sindicalismo: é na Escandinávia que temos as menores disparidades e os sindicatos mais fortes. Com um forte peso do sector público e com fortíssimos sindicatos, as sociedades escandinavas, que estão entre as mais competitivas no actual contexto da globalização, evidenciam que, no mínimo, não há uma relação necessária entre o peso do Estado, a força das organizações sindicais e o bom funcionamento dos mercados (ainda que bastante regulados). Mais, quando comparamos as taxas de sindicalização da Europa (34,7) com o mundo inteiro (15,0) somos obrigados a concluir que há uma correlação positiva entre a robustez do sindicalismo e o nível de desenvolvimento económico, social e político.»
Estas linhas, publicadas por André Freire aqui, reportam-se a um facto importante. Importante mas parcial, porque se esquece o factor-chave. É que, no caso das prósperas e competitivas economias escandinavas, não se trata apenas de um sindicalismo "robusto". Trata-se de um sindicalismo social-democrata, e, precisamente, não comunista: falamos das Landsorganisationen sueca, dinarmarquesa ou norueguesa. Como são historicamente próximos dos social-democratas a DBG alemã, ou próximos dos trabalhistas a TUC britânica.
Em termos de estratégia política, de capacidade de penetração nas empresas, de representação dos trabalhadores, e de inteligência negocial em sede de concertação social esta variável faz toda a diferença. Naturalmente, os governos e as confederações patronais lidam com sindicatos social-democratas e com sindicatos comunistas de forma diferente.
Foi assim no século XX. Será assim no século XXI.
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6 comentários:
Não são comunistas, são social-democratas.
Está bem.
Mas também não são "social-democratas", isto é não são CGTPs mas também não são UGTs que, ambas, tentam impingir orientações partidárias e controlar o movimento sindical.
"Naturalmente, os governos e as confederações patronais lidam com sindicatos social-democratas e com sindicatos comunistas de forma diferente.
Foi assim no século XX. Será assim no século XXI."
Desculpa, mas esta frase é "inaceitável". Não é aceitável exigir a quem quer que seja, em particular a filiados em sindicatos, que escolham a sua ideologia política em função do que a Direita, por exemplo sob a forma de confederações patronais, acha que é aceitável. Até parece que os sindicatos não têm meios de obrigar a negociações, se o outro lado se recusar a isso. Deixo a pergunta: imaginemos que apenas existia CGTP em Portugal, será que nunca haveria negociações?... Não me parece. O resultado delas não seria é tão favorável para o patronato.
Outro aspecto que me tem feito alguma impressão em alguns posts do Hugo é a ideia que passa amiúde de que a irrazoabilidade e o extremismo só existe do lado sindical. Então as exigências das confederações patronais e dos governos são sempre razoáveis, e apenas os sindicatos (comunistas) fazem exigências absurdas?! Pegando na comparação feita neste post, eu se calhar adicionaria que se por um lado o movimento sindical nórdico é mais razoável, é porque as confederações patronais nórdicas também são mais razoáveis. Talvez em Portugal o "problema" não esteja apenas na existência de um movimento sindical com uma forte componente de irrazoabilidade (CGTP) mas também na existência dum patronato extremista e quase analfabeto que acha que o progresso económico apenas se consegue através da liberalização do despedimento (individual), de baixos salários e condições de trabalho escravizantes. Ou será que não?... A lei da acção-reacção também existe nas relações sociais.
Pedro,
Não se trata de obrigar ninguém a escolher ideologia. Não é uma questão de ostracismo. Simplesmente, para negociar, é preciso que a outra parte esteja interessada. Como o Pedro bem diz, "a lei da acção-reacção também existe nas relações sociais". Estou completamente de acordo. Quando o sindicalismo não se revê no sistema, não está interessado em negociar.
"imaginemos que apenas existia CGTP em Portugal, será que nunca haveria negociações?... Não me parece. O resultado delas não seria é tão favorável para o patronato."
Depende de várias coisas. A começar pela estratégia do PCP.
Infelizmente, as pessoas parecem continuar a pensar que a negociação é um jogo de soma nula (a 'velha luta de classes'), em que só ganha o patronato, ou só ganham os trabalhadores. Esta forma de pensar é desastrosa.
Mas tem razão, precisaríamos de um patronato mais qualificado (como o Renato tem vindo a escrever), mais estratega, e sobretudo mais unificado. Se escrevo mais sobre os sindicatos, é porque são actores à esquerda, e porque não os considero agentes inimputáveis. E porque maior inteligência e cooperação sindical teria toda a probabilidade de permitir acordos mais inteligentes com um patronato mais disposto a procurar bases de entendimento comum e acordos que sirvam o país.
Hugo,
"Simplesmente, para negociar, é preciso que a outra parte esteja interessada. (...) Quando o sindicalismo não se revê no sistema, não está interessado em negociar."
Sabe bem que não é assim. Em todos os conflitos, por mais polarizados que sejam (e já estou a ir muito além do "mero" conflito laboral), há sempre interesse em negociar. Obviamente há negociações em que as partes estão mais longe uma da outra. Pelo menos nos conflitos onde a ausência de acordo tem custos avultados para ambos os lados (como os de índole laboral), a negociação resulta sempre em compromisso, e (até certo ponto) quanto mais a corda fôr esticada de um lado mais esse lado ganha. Pode ser politicamente incorrecto dizê-lo, mas a (aparente) intransigência de uma das partes frequentemente compensa (se se souber bem até onde ir, e não houver divisão no interior dessa parte).
"Infelizmente, as pessoas parecem continuar a pensar que a negociação é um jogo de soma nula (a 'velha luta de classes'), em que só ganha o patronato, ou só ganham os trabalhadores. Esta forma de pensar é desastrosa."
É verdade. Obviamente que seria muito melhor haver políticas inteligentes que a todos beneficie. Mas: 1) não é de todo claro que elas sequer existam (em grande número); 2) não cabe apenas ao lado sindical propô-las, mas também ao lado patronal, e infelizmente o que este tem para oferecer (em Porrtugal) é apenas a velha ladainha do "ou aceitam ou vão para o desemprego".
"Se escrevo mais sobre os sindicatos, é porque são actores à esquerda"
Comprendo, mas é preciso algum cuidado no modo como as coisas são apresentadas, até porque suponho que o Hugo não quer alienar as pessoas à Esquerda que gostaria de convencer com as suas ideias. Pedidos de "desarmamento unilateral" nunca foram especialmente populares...
"E porque maior inteligência e cooperação sindical teria toda a probabilidade de permitir acordos mais inteligentes com um patronato mais disposto a procurar bases de entendimento comum e acordos que sirvam o país."
É verdade, se... existir maior inteligência e cooperação patronal. Como defendi em cima, por vezes ser inteligente é ser-se intransigente, particularmente se a outra parte não demonstrar grande... inteligência e vontade de compreender as necessidades dos seus interlocutores. Nunca ouvi o patronato português oferecer publicamente medidas benéficas para os trabalhadores (excepto o.. têm sorte de manter os empregos, mais "horas de formação"), pedindo em troca outras medidas. Basicamente têm confiado nos sucessivos governos para negociar em seu nome...
Pedro,
«1) não é de todo claro que elas sequer existam (em grande número); 2) não cabe apenas ao lado sindical propô-las, mas também ao lado patronal, e infelizmente o que este tem para oferecer (em Porrtugal) é apenas a velha ladainha do "ou aceitam ou vão para o desemprego".»
Pois, é aqui precisamente que reside o problema. Não só a sua visão de (1) é falsa - vide a história da economia europeia pós-1945 -, como a sua visão de (2) legitima a contínua desresponsabilização dos sindicatos...Os patrões que 'resolvam'...E como os patrões não 'resolvem', fica tudo bloqueado. Isto é óptimo para os profissionais do protesto, mas para o país é desastroso.
«Sabe bem que não é assim. Em todos os conflitos, por mais polarizados que sejam (e já estou a ir muito além do "mero" conflito laboral), há sempre interesse em negociar.»
Haverá? Sugiro um estudo sério da estratégia da CGTP (que, claro, não é estratégia sindical, mas partidária).
«mas a (aparente) intransigência de uma das partes frequentemente compensa»
Claro que compensa. Para quem não está interessado em chegar a acordo, garanto-lhe que compensa! :)
"Nunca ouvi o patronato português oferecer publicamente medidas benéficas para os trabalhadores (excepto o.. têm sorte de manter os empregos, mais "horas de formação"), pedindo em troca outras medidas."
Tem de estar com mais atenção. E pedindo em troca outras medidas, claro. A negociação não é isso mesmo, uma troca? Ninguém dá nada de mão beijada; uma negociação envolve cedências mútuas. É assim que se constrói uma base da confiança entre actores, e que forneça a garantia que ninguém vai apunhalar o parceiro do acordo nas costas. O que chama "desarmamento unilateral" - o que parte da ideia de guerra, que já de si é a raíz do problema - é o acto necessário para se mostrar que se está de boa fé e que se trata de um parceiro credível de negociação. E quando não há negociação credível...o círculo vicioso mantém-se.
É uma situação clássica de dilema do prisioneiro: se ninguém cede ambos ficam piores do que se chegassem a um acordo. O resultado é o crescimento económico e os níveis de desemprego e de precariedade que temos.
Hugo
"Não só a sua visão de (1) é falsa - vide a história da economia europeia pós-1945 -,"
E como a história europeia pós-1970 demonstra, os detentores de capital estavam de tal modo insatisfeitos com o retorno que conseguiam deste que procederam a uma tentativa concertada de substituição de medidas "mutuamente" benéficas por medidas assimetricamente benéficas para o capital. Quando menciono medidas igualmente benéficas, estou a pensar em medidas que os dois lados aceitam sem terem de ser coagidos a tal. Ora, como os desenvolvimentos pós-1970 demonstram, muitas das medidas pós-1945 existentes na Europa, aparentemente consensuais, porque mutuamente benéficas, não o eram na realidade, só existindo em grande medida porque os sindicatos tinham poder suficiente para coagir o patronato a aceitá-las. Parece-me ingénuo, e contradito pela história das relações laborais, pensar que a enorme melhoria nas condições de trabalho que ocorreram no mundo ocidental ao longo do séc XX aconteceram porque o patronato achou que estava na hora de melhorar as condições de vida dos seus trabalhadores...
"como a sua visão de (2) legitima a contínua desresponsabilização dos sindicatos...Os patrões que 'resolvam'...E como os patrões não 'resolvem', fica tudo bloqueado."
Ambas as partes devem tentar identificar medidas positivas para ambos os lados, e áreas onde gostariam de progresso em troca de cedências noutras. Obviamente que o grande problema é a avaliação, necessariamente subjectiva, que cada um faz da importância relativa do que pede e do que está a oferecer.
"Sugiro um estudo sério da estratégia da CGTP"
Tem havido ou não acordos assinados pela CGTP? Por outro lado não deixa de ser interessante que nunca tenha havido uma revisão das leis laborais a que as entidades patronais se tenham oposto. Acho que isso diz também muito sobre quem **não** tem sido prejudicado ao longo dos vários governos que temos tido.
"Claro que compensa. Para quem não está interessado em chegar a acordo, garanto-lhe que compensa! :)"
Um exemplo do dia. O Irão tem-se mostrado intransigente quanto ao seu programa de enriquecimento de urânio. Neste momento o "pacote de incentivos" já vai na sua énesima versão. Se o Irão tivesse logo cedido, não teria a ganhar tanto como hoje. Claro, o segredo está em aceitar antes que a corda parta de modo definitivo.... a intransigência tem de ser sábia.
"Tem de estar com mais atenção."
Se o Hugo me conseguir dizer concretamente o que é o patronato português tem oferecido em conjunto com as sua exigências....
"O que chama "desarmamento unilateral" (...) é o acto necessário para se mostrar que se está de boa fé e que se trata de um parceiro credível de negociação."
Humm... parece-me que o Hugo tem uma visão muito idílica da dinâmica das relações humanas, nomeadamente num processo negocial.
"É uma situação clássica de dilema do prisioneiro: se ninguém cede ambos ficam piores do que se chegassem a um acordo."
Não necessariamente. Temos o exemplo português. As leis laborais têm sido revistas (genericamente) em detrimento das condições de trabalho, mas o progresso (económico) não tem aparecido, ou seja apesar (ou por causa) dos acordos um dos lados tem ficado (genericamente) pior.
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