«O que o 25 de Abril fez aos filhos dos pobres foi tirar-lhes a única hipótese de eles poderem ascender socialmente».
Esta frase é extraordinária. Foi proferida, naturalmente, por Maria Filomena Mónica [MFM] na quarta-feira à noite na discussão pública do documento publicado pela SEDES [agudamente criticado aqui]. Ela é, também, de uma extraordinária irresponsabilidade intelectual. A socióloga (não era, há uns tempos, historiadora; ou biógrafa?) não é conhecida por se apoiar em estudos nacionais e/ou internacionais para justificar as coisas que costuma proferir em público. Em que trabalhos se apoia MFM para dizer isto? Ou eles existem - e gostava de saber onde, feitos por quem, e com que dados - , ou isto é demagogia fácil e conservadorismo em estudo puro.
Quanto à origem deste tipo argumentos, não é preciso ir muito longe. Nos anos 60, quando o governo trabalhista de Howard Wilson decidiu abolir as grammar schools, o que argumentaram os conservadores? Precisamente o que MFM afirma: que eram os pobres que iriam ficar a perder! O raciocínio é mais ou menos este: dantes, uma minoria - cerca de 15% - podia seguir cursos universitários. Quem era, aos 11/12 anos, seleccionado para integrar a elite da geração seguinte praticamente tinha o seu futuro garantido. Separado o trigo do joio, a entrada para este núcleo era sinónimo inequívoco de sucesso e poder - económico, profissional, político. Os "filhos dos pobres" que conseguissem passar esta barreira tinham abertas as portas da elite britânica para o resto da vida.
A questão, claro, passa por cima da problema essencial: é que a presença dos filhos dos working classes nesses 15% era incrivelmente diminuta. Quem conseguia entrar, claro, era um dos 'eleitos', mas a imensa maioria ficava com os horizontes profissionais e sociais imediatamente cortados aos 11 anos - uma espécie de sistema onde the winner takes it all. Este sistema era uma máquina de reprodução de desigualdades de oportunidade.
Alguém acredita que um sistema educativo como o que existia antes do 25 de Abril ajudava os "filhos dos pobres"? Isto é pura intoxicação ideológica.
ADENDA: Em directo na SICNotícias, MFM, questionada pelo jornalista José Gomes Ferreira sobre a situação da pobreza em Portugal, afirma que «não conhece bem o país», que não «sai muito de casa», e prefere não «responder a essa questão», num momento sublime da televisão portuguesa. Considero respondidas as minhas dúvidas acima colocadas. E reforço o que disse: esta conversa é pura intoxicação ideológica e resulta de uma completa irresponsabilidade intelectual.
quarta-feira, 9 de julho de 2008
O que se esconde por trás do ataque ao "eduquês" II
Etiquetas:
desigualdades,
Maria Filomena Mónica,
mobilidade social,
sistema educativo
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4 comentários:
lá irresponsável ela é, desde sempre. Mas isso da intoxicação... só a dela, que ninguém a leva a sério. Um pouco como a presença contínua do Medina Carreira na TV.
Mais que irresponsabilidade, MFM denota ignorância. A senhora dátudo para aparecer no pequeno ecrã e tem um comportamento que me faz lembrar actrizes em decadência: precisam de aparecer, para se convencerem que ainda existem.
Demagogia? Irresponsabilidade?
Então ueres ver que são pessoas como Maria Filomena Mónica ou Medina Carreira que são os mais altos representantes desse tipo de discurso?
Não sabia. Com dezenas, para não dizer centenas, de figuras muito mais representativas deste tipo de "lógicas argumentativas", que nos entram pelos olhos e ouvidos a dentro todos os dias, escolhem estes?
É pena. E parece-me até desonesto.
Parece-me mais uma de muitas críticas a Maria Filomena Mónica e não ao "Eduquês" em concreto. Por exemplo, gostaria de ler a sua opinião sobre o livro de Nuno Crato.
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